Ex-prefeito Sérgio de Mello e mais seis viram réus por fraude na compra de merenda escolar

De acordo com denúncia do Ministério Público Federal, dispensa irregular de licitação em 2013 e uso de documentos falsos levaram ao favorecimento de associação em detrimento de agricultores familiares

Cidade
Guaíra, 5 de agosto de 2018 - 07h37

 

 

 

 

 

 

O ex-prefeito Sérgio de Mello está envolvido em mais um processo judicial em consequência de ações realizadas durante sua última gestão (2013-2016). Ele e outras seis pessoas vão responder por supostas fraudes cometidas em 2013 na aquisição de merenda escolar na cidade.

A Justiça Federal em Barretos recebeu a denúncia feita pelo Ministério Público Federal e instaurou ação penal contra os réus – uma ação civil por improbidade administrativa já está em andamento. O caso foi levado ao MPF, na época, pela vereadora Ana Beatriz Coscrato Junqueira.

Além do ex-chefe do Executivo, foram denunciados: Sebastião Vancim Filho, Basílica Botelho Muniz da Silva e Lucas de Sousa Lino, membros da comissão de licitação que conduziu o processo de contratação; e Maria José da Silva, Marli Aparecida da Silva e Edna Maria Vertello Silva, presidente e representantes da AMARP (Associação de Mulheres Assentadas de Ribeirão Preto), respectivamente.

Todos são acusados de falsidade ideológica, uso de documentos falsos e outras ilegalidades no processo licitatório para a escolha dos fornecedores dos alimentos. As irregularidades geraram prejuízo aos cofres públicos, além de lesar os agricultores familiares do município.

“Os denunciados Sérgio de Mello, Sebastião Vancim Filho, Basílica Botelho Muniz da Silva e Lucas de Sousa Lino, na qualidade de agentes públicos municipais de Guaíra/SP, agindo de comum acordo e com unidade de desígnios entre si e as denunciadas Maria José da Silva, Marli Aparecida da Silva e Edna Maria Vertello Silva, estas, respectivamente, representante legal e representantes de fato da AMARP, entre os meses de maio e agosto de 2013, na cidade de Guaíra/SP, no bojo do ‘Chamamento Público 01/2013’, dispensaram licitação para compra de produtos para a merenda escolar municipal, com recursos provenientes do PNAE, inclusive, sem observar as formalidades legais necessárias para a dispensa, favorecendo indevidamente esta associação em detrimento da União, do Município de Guaíra e das demais entidades de produtores rurais que participaram do certame”, declara o Procurador da República, Gabriel da Rocha, responsável pela denúncia.

Segundo ele, o esquema favoreceu a Associação, selecionada após desclassificação das demais entidades que participaram do chamamento público para compra da merenda. “A AMARP foi escolhida por, teoricamente, ser a única que continha agricultores de Guaíra entre seus quadros. Contudo, as investigações demonstraram que a maioria dos nomes apresentados pela associação não eram, e nunca foram, seus associados, bem como não forneceram, ou sequer produziam, os gêneros alimentícios especificados pela entidade”, aponta a Procuradoria da República do Estado de São Paulo.

DOCUMENTOS FALSOS

Segundo a denúncia, para consumar a fraude, Marli, Maria José e Edna Maria utilizaram documentos ideologicamente falsos. Já sabendo que o primeiro critério para a seleção da entidade seria a existência de produtores locais entre seus associados, elas apresentaram a relação de 22 agricultores familiares de Guaíra, identificados nos projetos de venda como os responsáveis pela produção dos alimentos a serem fornecidos. Na prática, porém, tais produtores nem conheciam as denunciadas. Alguns sequer trabalhavam com os gêneros elencados, caso de pecuaristas e pescadores apresentados pela associação como fornecedores de frutas e verduras. Ao fim, muitos produtos foram vendidos ao município por terceiros, que nem eram agricultores familiares.

“O golpe só foi possível com a participação dos agentes públicos municipais, que deixaram de fiscalizar o cumprimento das regras do chamamento público. O edital do certame exigia a cópia da declaração de aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (DAP) de cada um dos produtores participantes, e não apenas a listagem – que pode ser obtida pela internet”, afirma a Procuradoria.

“A diferença é importante, uma vez que pela cópia da DAP é possível verificar a atividade desenvolvida pelo produtor rural, o que serviria para auxiliar na identificação da fraude, caso os agentes públicos já não estivessem previamente ajustados com as representantes da AMARP”, acrescenta Gabriel da Rocha.

DISPENSA INDEVIDA

Segundo a legislação, embora obrigatório a princípio, o procedimento licitatório para a aquisição de produtos agropecuários pode ser dispensado desde que os preços sejam compatíveis com os vigentes no mercado local. No caso de Guaíra, as investigações demonstraram que os réus dispensaram a licitação de forma indevida, pois não observaram as formalidades exigidas por lei. “Uma das exigências é que seja feita a cotação prévia de preços de todos os produtos em, pelo menos, três estabelecimentos, o que não ocorreu. Além disso, no curso do chamamento público, os agentes municipais alteraram os valores de diversos produtos, sem que houvesse cotação prévia e sem justificativa formal. Em alguns itens, o custo mais do que quadruplicou – caso da cebolinha, que passou de R$ 2,39 no primeiro edital para R$ 10,90. O aumento dos preços pela Prefeitura permitiu que o custo da contratação subisse de R$ 318 mil para R$ 401 mil, ultrapassando os créditos orçamentários previstos”, apura a denúncia.

Ao fim, os valores contidos na chamada pública, bem como os apresentados na proposta da AMARP, ficaram acima dos vigentes no mercado local e daqueles praticados pelos agricultores familiares. “A associação não só apresentou a maioria dos preços próximos aos do edital de chamamento público, como também foi a única entidade com proposta de venda para todos os itens da merenda escolar, a maior parte dos quais, se constatou posteriormente, fornecidos por terceiros, que não constavam do projeto de fornecimento apresentado”, ressalta o procurador. No total, a Prefeitura de Guaíra pagou R$ 169 mil à entidade pelos gêneros alimentícios adquiridos.

CRIMES

O MPF pede a condenação dos réus pelos crimes de falsidade ideológica e uso de documentos falsos, previstos nos artigos 299 e 304 do Código Penal, e pela dispensa indevida de licitação, conforme consta no artigo 89 da Lei 8.666/93. A denúncia não requer a indenização pelos danos causados aos cofres públicos, pois tal pleito já é objeto da ação de improbidade administrativa nº 0001382-63.2016.403.6138, em trâmite na Justiça Federal de Barretos.

INÍCIO DA INVESTIGAÇÃO

O caso chegou ao Ministério Público Federal através da vereadora Ana Beatriz Coscrato Junqueira. “Só cumpri com meu papel e dever de fiscalização das ações do Poder Executivo. É uma denúncia que empenhei esforços na análise de possíveis irregularidades e que agora estão sendo comprovadas com a instauração de duas ações pela Justiça Federal, sendo uma por improbidade administrativa. Como cidadã, e principalmente vereadora, não poderia admitir que fraudes ocorressem em processos licitatórios, ainda mais em se tratando de verba para a merenda escolar de nossas crianças”, diz.

A Dra. Bia ainda completa: “preciso ressaltar que o bom gestor público deve primar pela legalidade, transparência e economicidade, o que não foi uma prática do governo do ex-prefeito Sérgio de Mello. Foram várias denúncias que agora estão sendo apuradas pelos órgãos competentes. Os governantes precisam entender de uma vez por todas que o dinheiro público é para ser bem gerenciado e para o bem da comunidade. A mão da Justiça está aí para coibir e punir possíveis desmandos e erros.”

RESPOSTA DOS ENVOLVIDOS

O Jornal O Guaíra entrou em contato com os investigados Sérgio de Mello, Lucas Lino, Sebastião Vancim Filho e Basílica Botelho Muniz. Lucas e Sebastião declararam que ainda não haviam sido citados e que aguardam um posicionamento de seus advogados para se manifestarem. Basílica desligou o telefone sem apresentar qualquer resposta.

Já o ex-prefeito petista enviou nota escrita por sua defesa, que segue na íntegra:

“a) Respeita-se totalmente o entendimento ministerial, sobretudo em seu zelo pela probidade. Porém, no dizente ao Senhor Sérgio de Mello, o mesmo tem total tranquilidade em face do processo, porque, não há qualquer irregularidade no exercício de suas funções na qualidade de prefeito;

  1. b) Lamentavelmente existe nos Autos, e isto será provado, grandes nuances de natureza política voltada a satisfação de interesses de grupo e pessoas contrárias as políticas públicas implementadas pelo então prefeito, e que, em realidade, conduziram a equivocada interpretação ministerial, convergindo para a propositura da Ação.
  2. c) E natural salutar o Ministério Público promova as investigações, porém a justiça, como se espera e se comprova nos autos, há de perceber que as decisões e atos praticados pelo então prefeito, o foram, no estrito comando legal, ademais com base em pareceres e elementos técnicos fornecidos por pessoal técnico municipal, inclusive detentores de cargos efetivos. O Sr. Sérgio de Mello, na qualidade de prefeito, jamais teve qualquer outro interesse que não o bem-estar da população. Por isto, também natural despertar eventuais insatisfações de ordem política inconfessáveis, ante a justiça e a opinião pública.
  3. d) Não exala dos autos, qualquer prática dos elementos tipificadores da improbidade administrativa, quais sejam, o dolo e a má-fé. E recentemente em importante medida a legislação brasileira com o advento da Lei.13.655/18 traz como necessidade indeclinável a comprovação destes elementos o que, objetivamente não se vê nos Autos. O Sr. Sérgio de Mello responde com a serenidade e altivez da consciência limpa as acusações. Sobretudo confia na justiça que, ciente da regularidade de suas condutas e no decurso do decurso do processo, chegará à conclusão inequívoca de que nenhuma das práticas supostamente irregulares a ele atribuídas, ocorreu. E sua inocência, será declarada. Para os devidos e cabíveis fins de direito.”

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